Machismo Estrutural e Privilégios do Homem

Machismo Estrutural e Privilégios do Homem

24/06/2019
Machismo estrutural é a construção, a organização, a disposição e a ordem dos elementos que compõe o corpo social, dando sustentação à dominação masculina, branca, heterossexual (entre outros atributos), em detrimento da condição autônoma

Machismo Estrutural e Privilégios do Homem

Por Helio Hintze - 24-06-19

(agradeço a cuidadosa revisão do texto pela Prof. Samira Maroun)

 

Conceito de Machismo Estrutural – conceito preliminar (este texto está em construção...)

I

Para partirmos na aventura de explorarmos criticamente a noção de ‘machismo estrutural’ é necessário que eu me situe quanto ao meu ‘lugar de fala’: não quero afirmar ‘lugar de fala’ como sendo eu dono daquilo que falo ou para afirmar em mim uma identidade fixa, longe disso; antes, meu intuito é apenas fazer uma localização no campo de disputas que doravante vou me posicionar. O autor deste texto, eu, é (ao menos está... pois não entendo ‘identidade’ como algo fixo...) um homem, branco, adulto, heterossexual, brasileiro, altamente qualificado em capital simbólico (títulos universitários: mestrado, doutorado e dois pós-doutorados). Há outras qualificações que poderiam me ajustar melhor no campo (de acordo com as ideias de Bourdieu), mas penso que, por ora, estas nos bastam. Digo tudo isso para fazer um exercício de autoanálise e autoposicionamento no sentido de que toda a temática que ora discuto, diz respeito em larga escala à minha posição privilegiada no campo social, ao meu ‘lugar de fala’, à perspectiva pela qual eu vivo, enxergo, compreendo e atuo na sociedade. É do ponto de vista de um homem privilegiado que inicio estas reflexões, portanto, expressões como ‘do homem’ vão, via de regra, me incluir, a não ser em clara indicação contrária.

Penso que a perspectiva que ofereço pode contribuir para os debates acerca do ‘machismo estrutural’ em nossa sociedade. Lembrando que tal perspectiva é fruto de até onde meus olhos, na tentativa do exercício crítico, puderam enxergar. Refletir sobre as ‘coisas’ da minha vida e olha-las da perspectivas que – para mim – elas se constituem privilégios é algo novo e difícil. Obviamente me parece que – ao longo dos estudos e dos diálogos com outras pessoas preocupadas com o tema – minha visão tenderá a criticizar-se (tornar mais crítica) e ampliar/aprofundar a acuidade de sua análise. Descobri que lutar contra o machismo é lutar contra mim mesmo em minha mais profunda subjetividade e na sociedade na qual vivo: pois esse mal constitui estruturalmente a ambos (aos sujeitos e à sociedade). Portanto, desde já é preciso afirmar que a estrutura machista atua, tanto na sociedade, quanto na subjetividade das pessoas – esse duplo movimento é importante de ser reconhecido para que possamos estudar o machismo estrutural com mais qualidade.

Apresentamos uma primeira noção do que entendemos por ‘machismo estrutural’ como sendo:

A construção, a organização, a disposição e a ordem dos elementos que compõe o corpo social, dando sustentação à dominação masculina, branca, heterossexual (entre outros atributos), em detrimento da condição autônoma do feminino, da mulher e de todos os gêneros que escapem a qualquer classificação binária na sociedade e em seus aspectos subjetivos.

Em sua estrutura, o machismo, longe de ser algo natural, é a forja do enaltecimento do que é socialmente construído ao longo dos tempos como ‘masculino’, um ininterrupto exercício de poder hegemônico por estabelecer o ‘masculino’ como condição natural e referência, a norma, o moralmente correto, a fonte e a causa de todos os comportamentos socialmente aceitos, ponto de partida e termo para toda intelecção e ação no mundo. Além disso, produz esse ‘masculino’ como parâmetro para comparação e (des)valorização dos demais elementos, produzindo assim hierarquizações, padrões de comportamento pré-estabelecidos, papeis sociais determinados e relações de poder verticalizadas (dentre diversos outros pontos), dominando, rebaixando e humilhando tudo o que é ‘feminino’, ou – como veremos – tudo aquilo que é ambíguo.

Esta estrutura machista é uma estrutura composta por diversas máquinas de produção de subjetividade (são esquemas de estruturação mental, de processamento do pensamento, de sentimento e de ação) que repetem ininterruptamente mensagens que reforçam a condição do macho como central e as demais (quando reconhecidas como existentes) como secundárias.

 

Naturalização e discurso

Tal condição de superioridade machista é naturalizada, ou seja, ao longo de sua história (importante afirmar que eles têm uma história e estão imersos no devir), é reconhecida como sendo ‘natural’ e ‘evidente’ (clara, aceitável, indiscutível pela incontestabilidade; indubitável, patente, irrefutável) e, portanto, é colocada fora do campo da crítica.

A estrutura machista condiciona a sociedade, o conjunto das interrelações sociais em nossa cultura, nossa subjetividade e mesmo nossos ambientes. Importante dizer: mas, condiciona não determina. É um discurso (mas, não é ‘apenas’ um discurso) sobre nossos costumes, nossas ideias de família, de comportamentos ideais para cada gênero, o humor e as ofensas; a ordem jurídica, a mídia, a segurança pública, entre tantos outros temas do âmbito social. A estrutura machista é uma estrutura construída por um discurso e como todo discurso constrói: identidades sociais, as relações sociais e os sistemas de conhecimento/crença.

Esse sistema machista é elaborado e naturalizado a partir de ideias paradigmáticas como ‘essência’, ‘natureza’, genética (entre outros conceitos...) que são exercícios de poder que retiram de cena o devir histórico e os jogos de poder que os subjazem.

Continuamos em breve nossas reflexões. Caso você tenha chegado até aqui, escreva-nos - para nós é importante saber como é que essas ideias chegam até nossos leitores. Se preferir, escreve para contato@fazerpensar.com.br

amplexos

Prof. Dr. Helio Hintze

www.heliohintze.com.br



por Helio Hinze
Helio Hinze

Educador e Filósofo / Palestrante e Consultor do Projeto Fazer Pensar da Usina do Conhecimento Educador do Projeto Sabores & Saberes: Educação para o Gosto Consultor Associado GKS Consultoria Atuou como Professor Universitário em diversas Universidades: UFSCAR - Sorocaba, UNIMEP Piracicaba, SENAC, Uniararas